terça-feira, 8 de abril de 2008

China, uma potência marítima



A afirmação do arquiteto inglês Norman Foster de que a experiência dos chineses em construir navios foi determinante na construção do Teminal 3 do Aeroporto Internacional de Pequim trouxe à memória uma edição da revista Superinteressante de dezembro de 2006, que falava de viagens chinesas ao redor do mundo em 1421, logo após a inauguração da Cidade Proibida, que tinha 1.500 vezes o tamanho da cidade de Londres murada, no início da Dinastia Ming. A população era 50 vezes maior.

A publicação tratava do livro “1421 – O Ano em que a China Descobriu o Mundo”, do inglês Gavin Menzies. Percorri alguns sebos e acabei comprando o livro no Estante Virtual, site na internet que centraliza o acervo de pelo menos 800 sebos ao redor do Brasil.

Estou na página 333 de 550, mas estou espantado desde o início. Após 14 anos de pesquisas e viagens ao redor do mundo, muitas vezes dentro do submarino que comandava como membro da “Real Marinha Britânica”, o autor refez viagens desenvolvidas por frotas chinesas em 1421 a 1423 para narrar o encontro desse povo com culturas tão antigas quanto a sua própria, como os maias. Menciona, por exemplo, a beleza da cidade maia de Palenque, em Chiapas, no México. Visitou "mais de 900 museus" e conversou com especialistas, além de citar uma bibliografia incrível.

Com afirmações contundentes como (em 1421) “os chineses tinham mais de seis séculos de experiência em navegação oceânica” e também “na construção de compartimentos de colisão, que são espaços (submersos) fechados, à prova d´água, esgotados com uso de bombas de rosca [de parafuso ou helicoidal] tipo ‘Arquimedes’ [séculos antes de Leonardo da Vinci tê-las ‘inventado’], o que permitia que trabalhassem abaixo da linha de flutuação. Em começos do período Ming, dispunham mesmo de equipamento de mergulho com tubos de respiração e máscaras”, Menzies vai demolindo página a página todo o conhecimento passado em relação aos descobrimentos, afirmando categoricamente que os europeus chegaram às Américas e à Austrália graças a mapas produzidos por chineses. Palavra de inglês.

Segundo ele, em 1428, Pedro (o Duque de Coimbra, "Príncipe das Sete Partidas", segundo a Wikipedia, filho mais velho do Rei de Portugal Dom João I e irmão de Dom Henrique, o Navegador) teria obtido em Veneza um mapa do mundo que continha descritas todas as partes do mundo e da terra. (página 123) O tal mapa teria sido produzido por chineses e fundamental para guiar os portugueses.

Embasa suas descobertas no conhecimento adquirido na leitura de cartas náuticas e vai fundo nas citações tanto de mapas quanto no trabalho em rochas nas quais os chineses teriam deixado suas marcas ao redor do mundo, em uma postura anti-preservacionista, mas que permitiu a ele identificar os rastros chineses. Chega um momento da leitura em que fica difícil decidir se o mais fantástico era os chineses fazerem o que ele diz que faziam ou ele próprio ter conseguido reconstruir tudo aquilo.

Em relação às Américas, cita e localiza em mapa 11 evidências que provariam a presença chinesa no continente antes de Cristóvão Colombo, entre elas um junco afundado e a existência de uma aldeia chinesa e de pessoas que falavam chinês em Sacramento (EUA); a presença de uma âncora chinesa em Los Angeles (EUA), arte rupestre em caverna no México, onde há também corantes desenvolvidos sob influência de chineses; existência de galinhas asiáticas; índios venezuelanos com DNA chinês; aldeia no Peru de pessoas que falam chinês, país onde foram encontrados bronzes com inscrições chinesas; e âncoras e anzóis chineses encontrados no Equador.

Um junco chinês, chamado Ba Chuan [pronuncia-se Pa Tchuan], teria cerca de 135 metros de comprimento, um monstro na comparação com as Caravelas portuguesas de cerca de 20 metros, como o faz a Superinteressante e também esta imagem aí abaixo. Segundo o autor, em 1421, a segunda esquadra mais poderosa era a de Veneza, que contava com 300 galeras, cujas maiores mediam 45 metros de comprimento e 6 metros de largura e transportavam 50 toneladas de carga, enquanto um Ba Chuan chinês podia transportar 200 toneladas de carga. A China dispunha de cerca de 3.750 embarcações, que para serem construídas consumiram literalmente florestas inteiras e muitas reservas financeiras do país, com um impacto ambiental e econômico que acabou culminando com a queda do imperador pouco tempo depois. Eram 250 navios de tesouro, 1.350 barcos de patrulha, outros 1.350 navios de guerra, 400 navios maiores de guerra e 400 cargueiros para transporte de cereais, água e cavalos.

É impressionante a quantidade de detalhes sobre os chineses e muitos outros povos dessa época medieval, como as comparações em relação ao que representava a Europa nessa época, também destacado na revista. O autor faz comparações a todo instante, como: “Os cientistas europeus só comprovaram no século XVIII o que os chineses sabiam havia séculos, isto é, que algumas plantas podem indicar a presença de ouro e outros metais.”

Ou então: “os europeus dessa época eram quase os únicos a comerem galinhas e seus ovos. No sudeste da Ásia e na China, as galinhas serviam para um fim inteiramente diferente. Nos costumes divinatórios chineses (...) as galinhas melanóticas protegiam o lar de maus espíritos.” Curioso é que atualmente, aqui no Brasil, se fala o mesmo dos gatos. Para esses chineses, provavelmente, comer galinha era tão estranho quanto para nós parece ser comer cachorro... É a cultura.

Além de um livro espetacular, o material pesquisado passou a ser usado também no site de Gavin Menzies, o http://www.1421.tv/index.asp.

Um comentário:

Anônimo disse...

A pergunta que não quer calar é: o que aconteceu com essa potência marítima? Qual foi o elo perdido que fez a China desistir de sua frota naval? Já ouvi e li um monte de teorias, mas nenhuma delas parece ser a definitiva.

E acabei de ler um livro sobre piratas que fala um pouco sobre os piratas chineses, que dominaram durante muito tempo os mares da região - da Rússia até indonésia, às vezes até a India. Num dos relatos, fala que a pirataria chinesa, num dado momento, se concentrou nos rios do país, dada a riqueza das cidades interioranas e ao completo dominio dos mares pelos chineses - ou seja, chegou um momento, que eram poucos barcos estrangeiros a serem saqueados na região...

muito bom o tema, vou navegar pelos links...